O Holocausto como objeto de estudo
Os alunos da 2ª série do Ensino Médio estão aprendendo sobre o Holocausto nas aulas de história, com o professor André Bacci. Para auxiliar a todos na interpretação e compreensão desse tema, o professor escreveu um texto reflexivo. Confiram:
O Holocausto como objeto de estudo
Por André Bacci
Vasculhar a história pode ser, às vezes, como mergulhar
no mar em busca de objetos, aqui rastros, vestígios do que aconteceu no
passado. Se o objeto que buscamos se encontra em águas profundas, podemos
contar com a ajuda de uma lanterna que, na disciplina histórica, constitui a
própria interpretação do historiador. Este equipamento o auxiliará a enxergar
onde a luz é escassa e será mais potente quanto mais perspicaz e dedicada for a
pesquisa. À meia profundidade, há também meia luz. Alguns raios solares
alcançam estas águas, mas a limitação proporcionada pela fragmentação dos
documentos pode constituir um entrave às elaborações do historiador. As peças
do quebra-cabeça histórico são, neste caso, poucas e desgastadas; a luz da
lanterna interpretativa é ofuscada pela tímida e rarefeita luz natural que
incide palidamente sobre os objetos do passado.
Para estudarmos o
holocausto, contudo, há de se atravessar uma fina camada de pouco mais de
setenta anos. Na superfície, há abundância de luz, e no caso da Shoá, os
fragmentos do passado são muitos e ainda submergem tão próximos à flor d’água
que é possível observá-los do lado de fora. Ao analisarem este objeto, porém,
muitos pesquisadores deixam na água suas próprias considerações, que vez ou
outra aderem ao objeto de estudo, o deformando e desfigurando. Não raro tais
deformações são brilhantes e por isso mesmo refletem a forte luz do Sol,
cegando outros pesquisadores.
O
estudo do holocausto torna-se tão complicado quanto permitem a fartura da
documentação e a proximidade do evento. Pessoas que estiveram diretamente
envolvidas, vítimas e algozes, ainda vivem enquanto escrevo estas palavras.
Assim, a delicadeza no trato do assunto deve contrastar respeitosamente com a
rudeza que fora dispensada às próprias vítimas do nazismo exterminador. Por
isso, a metáfora do mergulhador que ensaio acima falha apenas num ponto: na história, ao contrário do que ocorre no
mar, a pressão pode ser muito maior na superfície que nas águas mais abissais.
Aceitando
que possivelmente o holocausto assinale “os confins onde o conhecimento
histórico vê colocada em discussão sua própria competência”[1], não pretendo, nestas
linhas, abraçar toda a problemática da questão nazista e do genocídio judeu.
Abordaremos, antes, alguns elementos que considero relevantes numa abordagem do
tema que seja coerente com as necessidades da comunidade que é alvo desta aula.
[1] LYOTARD, Jean-François. Le Differend. Citado por
GINSZURG, Carlo. O Extermínio dos Judeus
e o Princípio da Realidade in MALERBA, Jurandir (org.). A História Escrita. Contexto. São Paulo,
2006 (p. 226).
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