Um panorama da Guerra Fria
Para conceituar guerra total e guerra fria, e relacioná-las, o professor de História, André Bacci convida os alunos da 2ª série do ensino médio a ampliarem seus conhecimentos com o artigo abaixo:
A urgência do fim do mundo: Um panorama da Guerra Fria
Tida
por muitos como a terceira guerra mundial, a guerra fria abrange um longo
período da história recente. No imediato pós II Guerra, ainda no ano de 1946,
Winston Churchill dissera que “o clima iluminado pelas vitórias aliadas” estava
ameaçado pelos soviéticos, “que em todo o leste europeu baixavam uma cortina de
ferro”. O conflito ideológico que opôs o consumismo ao comunismo durou até 1989.
Mas a Guerra Fria não se estendeu longamente apenas no tempo, como também no
espaço, tendo-se em conta que o muro de Berlim, que seria ulteriormente
derrubado como símbolo do fim das animosidades, dividiu fisicamente a cidade
donde seu nome, mas na prática dividiu o mundo inteiro entre bloco capitalista
e bloco comunista, liderados respectivamente pelos Estados Unidos e União
Soviética.
Lançando
o que se chamou doutrina Truman[i],
pela qual os Estados Unidos se apresentavam como “defensores do mundo livre”
contra os regimes que promoviam, segundo os EUA, o “terror” e a “opressão”, o
presidente Henry Truman diria que conter o avanço do comunismo era “um dever
dos Estados Unidos da América”. Obviamente, por trás deste discurso urge a
necessidade do capitalismo expandir e conquistar mercados cujo acesso ficava
cada vez mais difícil em função do fomento do comunismo em vários países da
Europa e da Ásia.
De
grande valia para os americanos foi ainda o plano Marshal, que se constituiu
basicamente numa política que tinha como propósito a ajuda financeira dos EUA
para reconstrução dos países europeus cuja infraestrutura havia ficado precária
em razão da II Guerra. Em troca, estes países deveriam desenvolver políticas
para contenção do comunismo.
Outrossim,
o aspecto mais marcante da Guerra Fria foi o macarthismo[ii],
política interna que impunha grave perseguição aos comunistas. Estava baseada
na ideia de uma ameaça constante de uma rede de conspiração soviética espalhada
pelo mundo. O macarthismo e suas versões presentes em vários países
capitalistas, inclusive no Brasil e em outros países da América Latina, tolheu
gravemente a liberdade de expressão nestes mesmos países. O apoio dos Estados
Unidos aos governos conservadores se deu abertamente. O macarthismo ganhou
muito de sua força ainda no início das tensões, já que a criação da OTAN[iii]
data de 1949, ou seja, seis anos antes do Pacto de Varsóvia. Neste período os
americanos já empenhavam perseguição ao comunismo, ao passo que apenas em 1955
a recíproca tornara-se verdadeira na mesma intensidade. Mesmo nos filmes que
traziam como personagem principal o agente James Bond, representado pelo
britânico Sean Connery – que foi caracterizado com certa semelhança física com
o próprio Joseph McCarthy, os inimigos eram os “subversivos”, modo como os
americanos chamavam os comunistas.
No
entanto, ao tempo em que os soviéticos faziam avanços reais no campo, por
exemplo, da astronáutica, os americanos faziam o que melhor sabem fazer: shows.
Note-se que em 1957 os soviéticos enviaram o primeiro ser vivo ao cosmos[iv]
e puseram o primeiro satélite artificial na órbita da Terra, o Sputnik I; foi
somente no ano seguinte que os americanos lançaram seu programa espacial. No
ano de 1961 o russo Yuri Gagarin seria o primeiro ser humano a visitar o
Cosmos. Na mesma década o americano Neil Armstrong pisaria na Lua, fato até
hoje contestado inclusive por muitos americanos.
Polêmica
a parte, os Estados Unidos chegariam à frente na corrida espacial recorrendo a
uma arma que se mostraria potente: o apelo midiático. Antes mesmo de Silvester
Stalone derrotar o gigante, malvado e trapaceiro boxeador russo representado
por Dolph Laundgren[v] e
do grupo de Punk Rock “Ramones” lançar um disco chamado “Rocket to Russia”[vi]
inúmeros filmes, músicas e até jogos de videogames produzidos pelos americanos representavam
os soviéticos como terroristas, primitivos e imorais. No tocante à corrida
espacial, o E.T. de Steven Spielberg escolheria os Estados Unidos para visitar,
o mesmo que fariam vários alienígenas que, quando pediam para levá-los ao líder
da Terra, eram introduzidos ao presidente americano. Nos filmes hollywoodianos
produzidos durante a Guerra Fria, os americanos visitavam as estrelas, palco de
jornadas e guerras, com a mesma frequência que comiam hambúrgueres. Esta é,
aliás, apenas uma das “commodities” americanas enfiadas goela abaixo dos países
capitalistas de menor expressão. A lista inclui a Coca-Cola, a calça jeans e
tantas outras que compõem o dito “American Way of Living”[vii].
Até
os anos finais da Guerra Fria era comum que nas escolas brasileiras, por
exemplo, às crianças fosse ensinado que fazíamos parte do Terceiro Mundo,
conceito desenvolvido pelos americanos para designar os chamados países
subdesenvolvidos que ficavam sob a influência do bloco capitalista ou do bloco
comunista.
Um
marco da disputa entre americanos e soviéticos por alguns destes países foi a
Guerra do Vietnã, pela qual nota-se que em muitos momentos a Guerra Fria parece
ser uma rusga entre irmãos mais velhos que, por medo de se machucarem numa
briga, fazem os irmãos menores brigarem. Se a corrida armamentista gerou o que
chamamos de “equilíbrio do terror” pelo medo do iminente fim do mundo por armas
nucleares, para os vietnamitas, o fim do mundo parecia já ter chegado. Embora
tenha vencido a guerra (ao contrário do que os filmes americanos sobre o tema
sugerem), o Vietnã ficou destruído em razão dos conflitos.
Embora
não sejam o objeto desta breve descrição, outros eventos de grande importância
vinculam-se diretamente com a Guerra Fria, como a crise dos mísseis em Cuba, a
revolução pelos direitos dos negros nos EUA e o processo de descolonização da
África e da Ásia.
No
mais, cumpre dizer que as tensões acabaram. O muro foi derrubado e o
capitalismo penetrou além da cortina de ferro. O fim do mundo não veio pela
Guerra Fria. Ironicamente, é o caráter predatório do próprio capitalismo que
está esgotando os recursos naturais e levando as relações humanas aos píncaros
do insustentável, pelo que em nossos dias o fim do mundo entra novamente em
voga. Lamentavelmente, agora ele é muito mais verossímil. Prof.
André Bacci
[i]
A doutrina Truman leva este nome por ter sido desenvolvida a partir de um
discurso do presidente Henry Truman ao senado americano, em 1947.
[ii]
Chama-se assim por ter sido Joseph McCarthy o seu principal responsável.
[iii]
Organização do Tratado do Atlântico Norte.
[iv]
O primeiro ser vivo a visitar o espaço foi a cadela Laika, que embora seja
assim conhecida, este provavelmente não era o seu nome, senão sua raça, i.e.,
“Laika Russo Europeu”.
[v]
O nome de seu personagem, Ivan Drago, pode denotar a demonização dos soviéticos
pelos americanos.
[vi]
Literalmente “Foguete para a Rússia”.
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